Faustino Henrique|
A intolerância política e a readaptação
24 de Maio, 2011
Depois de terminada a primeira fase das audições, interpelações e depoimentos no âmbito do inquérito sobre as alegações da UNITA relativas aos supostos casos de intolerância política impõe-se fazer algumas reflexões.
Não se trata propriamente de uma antecipação às conclusões da comissão parlamentar, mas apenas um exercício para inferir sobre a natureza do problema, para elogiar o gesto que levou à criação da comissão e enfatizar o que se pode aprender com as suas investigações.
Quando foi criada, por iniciativa da UNITA, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) propôs-se averiguar as reclamações do partido do "Galo Negro" sobre o que chama de intolerância política. Por intolerância política, a UNITA, segundo o que se pode depreender, pretende reclamar de todos os incidentes que envolvem a sua não-aceitação em determinadas áreas do país, tendo como fulcro razões políticas.
Embora nesta circunstância as coisas circunscrevam-se mais ao planalto central, a UNITA sustenta ainda que os casos de intolerância envolvem a perseguição e assassinato dos seus militantes, destruição dos seus bens e a recusa da sua bandeira ser desfraldada nas sedes municipais ou comunais. E tudo isso com cunho político partidário, razão pela qual o maior partido da oposição denomina todos estes incidentes de intolerância política.
Era necessário criar um ambiente que levasse ao esclarecimento destes problemas, com a particularidade relevante de se tirarem importantes lições desta experiência.
Foi assim que, durante a 19ª sessão ordinária da Assembleia Nacional, se criou a Comissão Parlamentar de Inquérito, coordenada pelo deputado Higino Carneiro e composta por 15 deputados, sendo 12 do MPLA e os restantes da UNITA, PRS e FNLA, com um deputado cada, de acordo com o princípio da proporcionalidade previsto no regimento interno.
A iniciativa foi louvável na medida em que se pode mesmo dizer que é um ganho para a nossa democracia. É seguramente a primeira vez que se cria, ao nível da Assembleia Nacional, uma comissão constituída inteiramente por deputados para inquerir sobre queixas apresentadas por um partido político.
Voltando à essência do problema, importa levantar a questão sobre a pertinência do que a UNITA chama de intolerância política. Não se pretende rejeitar que não terão existido casos que envolvessem excessos na rivalidade político-partidária entre militantes, de forma isolada. A dúvida prevalece sobre o envolvimento explícito ou implícito do partido no poder, dos seus dirigentes políticos ao nível da província do Huambo, municípios ou comunas.
Qualificar como intolerância casos que assumem claramente uma essência meramente policial é um exercício político evitável, por um lado. Por outro lado, os desmentidos iniciais relacionados com pessoas dadas como assassinadas por razões políticas alvitram alguma precipitação do partido do "Galo Negro" na província do Huambo.
A UNITA, enquanto maior partido da oposição, além de não precisar deste tipo de exercício, tem responsabilidades acrescidas no quadro da nossa democracia.
Numa altura em que os trabalhos da CPI não estão ainda concluídos, a UNITA, num gesto pouco digno de quem teve a iniciativa de criação da referida comissão, já vem a público pôr em causa o desempenho da mesma.
Com este tipo de exercício político, a UNITA tende a minimizar-se a si mesma, na medida em que procurar imputar o seu eventual fracasso de reimplantação em determinadas zonas do país ao partido no poder não a ajuda. Teria sido mais perspicaz da parte da UNITA se tivesse optado por sugerir a criação de uma comissão independente.
Mas quando a deputada da UNITA, Clarice Caputo, afirma que a tarefa da Comissão Parlamentar de Inquérito reflecte o espírito da missão dos deputados em ver esclarecido o assunto, expõe falta de seriedade ao colocar em causa uma entidade advogada pela própria UNITA.
Sabiam de antemão que a criação da CPI e eventualmente os procedimentos da sua actuação, como era de esperar, obedeceria ao critério da proporcionalidade decorrente da representatividade partidária ao nível do parlamento.
Ao invés de procurar investir no que todos os angolanos podem aprender com a experiência ou legado desta comissão parlamentar, a UNITA procura fazer o mais difícil. O partido do "Galo Negro" precisa de ponderar seriamente sobre o papel que teve até 2002, o seu aterrador passivo e a reconciliação para com o povo.
Uma das lições que a UNITA deve retirar de tudo isto por que está a passar e que prefere denominar de intolerância política, é que para o povo angolano o partido que fez oposição armada e o que está no poder não constituíam peças de uma mesma engrenagem.
Às vezes, os militantes da UNITA, quando confrontados com uma observação sobre o papel de cada um dos mais influentes partidos políticos angolanos, tendem a dizer que ambos cometeram erros na mesma proporção.
Isto não é verdade aos olhos do cidadão comum e do povo, independentemente das manipulações a que o povo pode estar sujeito, tão-pouco em função da relativa maturidade política.
A UNITA precisa provavelmente de uma catarse política profunda, que venha despertá-la sobre a necessidade de uma ampla reconciliação com o povo angolano em geral e com a sua base eleitoral em particular.
Daqui a meses não estranhemos se uma das conclusões que o painel criado para averiguar os casos de intolerância vier a arrematar que, com excepção de um ou outro caso, a grande maioria das alegações não passam de casos isolados de polícia.
O resto é tudo consequência do legado tenebroso da UNITA, um passado que o partido do "Galo Negro" pretende simplesmente diluir passando uma borracha.
Não será melhor assumir esse passado e que, entre outras iniciativas, passaria também por um pedido público de desculpas, particularmente pelo reacender do conflito entre 1992 e 2002?
Está de parabéns a Assembleia Nacional pela iniciativa que teve, um reflexo da nova realidade que se coloca, no âmbito da fiscalização de casos políticos.
Depois de terminada a primeira fase das audições, interpelações e depoimentos no âmbito do inquérito sobre as alegações da UNITA relativas aos supostos casos de intolerância política impõe-se fazer algumas reflexões.
Não se trata propriamente de uma antecipação às conclusões da comissão parlamentar, mas apenas um exercício para inferir sobre a natureza do problema, para elogiar o gesto que levou à criação da comissão e enfatizar o que se pode aprender com as suas investigações.
Quando foi criada, por iniciativa da UNITA, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) propôs-se averiguar as reclamações do partido do "Galo Negro" sobre o que chama de intolerância política. Por intolerância política, a UNITA, segundo o que se pode depreender, pretende reclamar de todos os incidentes que envolvem a sua não-aceitação em determinadas áreas do país, tendo como fulcro razões políticas.
Embora nesta circunstância as coisas circunscrevam-se mais ao planalto central, a UNITA sustenta ainda que os casos de intolerância envolvem a perseguição e assassinato dos seus militantes, destruição dos seus bens e a recusa da sua bandeira ser desfraldada nas sedes municipais ou comunais. E tudo isso com cunho político partidário, razão pela qual o maior partido da oposição denomina todos estes incidentes de intolerância política.
Era necessário criar um ambiente que levasse ao esclarecimento destes problemas, com a particularidade relevante de se tirarem importantes lições desta experiência.
Foi assim que, durante a 19ª sessão ordinária da Assembleia Nacional, se criou a Comissão Parlamentar de Inquérito, coordenada pelo deputado Higino Carneiro e composta por 15 deputados, sendo 12 do MPLA e os restantes da UNITA, PRS e FNLA, com um deputado cada, de acordo com o princípio da proporcionalidade previsto no regimento interno.
A iniciativa foi louvável na medida em que se pode mesmo dizer que é um ganho para a nossa democracia. É seguramente a primeira vez que se cria, ao nível da Assembleia Nacional, uma comissão constituída inteiramente por deputados para inquerir sobre queixas apresentadas por um partido político.
Voltando à essência do problema, importa levantar a questão sobre a pertinência do que a UNITA chama de intolerância política. Não se pretende rejeitar que não terão existido casos que envolvessem excessos na rivalidade político-partidária entre militantes, de forma isolada. A dúvida prevalece sobre o envolvimento explícito ou implícito do partido no poder, dos seus dirigentes políticos ao nível da província do Huambo, municípios ou comunas.
Qualificar como intolerância casos que assumem claramente uma essência meramente policial é um exercício político evitável, por um lado. Por outro lado, os desmentidos iniciais relacionados com pessoas dadas como assassinadas por razões políticas alvitram alguma precipitação do partido do "Galo Negro" na província do Huambo.
A UNITA, enquanto maior partido da oposição, além de não precisar deste tipo de exercício, tem responsabilidades acrescidas no quadro da nossa democracia.
Numa altura em que os trabalhos da CPI não estão ainda concluídos, a UNITA, num gesto pouco digno de quem teve a iniciativa de criação da referida comissão, já vem a público pôr em causa o desempenho da mesma.
Com este tipo de exercício político, a UNITA tende a minimizar-se a si mesma, na medida em que procurar imputar o seu eventual fracasso de reimplantação em determinadas zonas do país ao partido no poder não a ajuda. Teria sido mais perspicaz da parte da UNITA se tivesse optado por sugerir a criação de uma comissão independente.
Mas quando a deputada da UNITA, Clarice Caputo, afirma que a tarefa da Comissão Parlamentar de Inquérito reflecte o espírito da missão dos deputados em ver esclarecido o assunto, expõe falta de seriedade ao colocar em causa uma entidade advogada pela própria UNITA.
Sabiam de antemão que a criação da CPI e eventualmente os procedimentos da sua actuação, como era de esperar, obedeceria ao critério da proporcionalidade decorrente da representatividade partidária ao nível do parlamento.
Ao invés de procurar investir no que todos os angolanos podem aprender com a experiência ou legado desta comissão parlamentar, a UNITA procura fazer o mais difícil. O partido do "Galo Negro" precisa de ponderar seriamente sobre o papel que teve até 2002, o seu aterrador passivo e a reconciliação para com o povo.
Uma das lições que a UNITA deve retirar de tudo isto por que está a passar e que prefere denominar de intolerância política, é que para o povo angolano o partido que fez oposição armada e o que está no poder não constituíam peças de uma mesma engrenagem.
Às vezes, os militantes da UNITA, quando confrontados com uma observação sobre o papel de cada um dos mais influentes partidos políticos angolanos, tendem a dizer que ambos cometeram erros na mesma proporção.
Isto não é verdade aos olhos do cidadão comum e do povo, independentemente das manipulações a que o povo pode estar sujeito, tão-pouco em função da relativa maturidade política.
A UNITA precisa provavelmente de uma catarse política profunda, que venha despertá-la sobre a necessidade de uma ampla reconciliação com o povo angolano em geral e com a sua base eleitoral em particular.
Daqui a meses não estranhemos se uma das conclusões que o painel criado para averiguar os casos de intolerância vier a arrematar que, com excepção de um ou outro caso, a grande maioria das alegações não passam de casos isolados de polícia.
O resto é tudo consequência do legado tenebroso da UNITA, um passado que o partido do "Galo Negro" pretende simplesmente diluir passando uma borracha.
Não será melhor assumir esse passado e que, entre outras iniciativas, passaria também por um pedido público de desculpas, particularmente pelo reacender do conflito entre 1992 e 2002?
Está de parabéns a Assembleia Nacional pela iniciativa que teve, um reflexo da nova realidade que se coloca, no âmbito da fiscalização de casos políticos.