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domingo, 10 de abril de 2011

O golpe militar internacional na Costa do Marfim

Álvaro Domingos |

O golpe militar internacional na Costa do Marfim

09 de Abril, 2011
Em Abidjan tropas francesas e da ONU disparam sobre o palácio presidencial onde, como dizem os propagandistas do ocidente, o Presidente Gbagbo está refugiado. O Presidente constitucional está no seu posto, no palácio presidencial. É o seu lugar, não é um refúgio. O mundo assiste a estes atropelos impávido e sereno como se a violência fosse solução para os problemas da humanidade e a falta de respeito pela soberania nacional seja uma coisa normal e aceitável à luz do direito internacional.
É grave que no século XXI existam tropas francesas num país africano independente e membro da ONU. Mas a gravidade da situação não altera a realidade. Tropas francesas estão em muitos países africanos para impor a ordem à francesa mesmo que ela seja a desordem completa.
Em Abidjan a ordem de Paris está a ser imposta à lei da bala. Os civilizados franceses matam gente inocente, destroem equipamentos e edifícios, colocam a Costa do Marfim em estado de sítio. Depois apresentam a factura ao presidente que eles querem ao comando do país. E ele, como foi ajudado pelas armas dos franceses, ­paga. Até é capaz de pagar mais alguma coisa pelas “quebra”.
Esta situação devia cobrir de vergonha todos os democratas do mundo e os povos livres. Mas a ONU tem tropas em Abidjan a matar civis e a disparar sobre o palácio onde está o presidente constitucional. Pior do que isto é impossível. A ONU existe para promover a paz e a concórdia. Mas basta uma ordem de Washington, Londres ou Paris e a organização que deve ser a mais forte guardiã da paz mundial prepara as armas, faz as mochilas e parte para os teatros de operações. Na Costa do Marfim as tropas da ONU são forças invasoras e carregam às costas centenas de vítimas civis.
Na Costa do Marfim não existe uma guerra civil como a propaganda ocidental pretende fazer crer. O que existe é uma agressão armada da ONU e da França contra um estado soberano. O que existe é um golpe militar de forças internacionais contra o Presidente Constitucional. E também existem os massacres do costume. Para intimidar os patriotas, os que ousam enfrentar invasores e ocupantes, os soldados da ONU e da França matam civis como quem bebe um copo de “rouge”. As vozes que se levantam contra a ingerência, contra o golpe de militares internacionais e os seus massacres são muito débeis. Não têm a força que está por trás de Ban Ki-monn ou Sarkozy. Porque se o exército da Costa do Marfim for capaz de derrotar as tropas ocupantes da França e da ONU, amanhã avança a OTAN. É só aumentar o raio de acção dos aviões que estão a destruir a Líbia. Por trás da “aliança” ocidental estão as maiores potências militares mundiais e ninguém pode esperar ganhar numa luta tão desigual. Mas como sempre, aos agressores falta o povo. Por isso é que surgem os massacres, para que ninguém ouse levantar-se contra os invasores.
Na Costa do Marfim os agressores até já têm rebeldes capitaneados por um presidente eleito num escrutínio feito à medida dos seus interesses e não no respeito pelas normas constitucionais. Mas a ONU não quer saber da vida dos civis, nem aprova resoluções que permitam defender as populações indefesas. Para cada caso, há uma medida diferente. Para cada situação, há o peso que interessa aos invasores. Os massacres em cidades e vilas vão ser “investigados” por quem os cometeu. Os matadores vão saber quem foi que massacrou.
Na Líbia a situação é ainda mais grave. A ONU deu luz verde à guerra com o pretexto de que é preciso proteger os civis. Mas os países que comandam a guerra estão a dar armas terríveis aos “rebeldes”. França, Grã-Bretanha e EUA até declararam solenemente que vão fornecer ainda mais armas aos que estão a destruir o seu país e fazem apelos patéticos a que sejam intensificados os bombardeamentos à sua pátria. Para proteger civis, a ONU manda matar civis. Porque aqueles que estão do lado da OTAN são os bons. Os que estão do lado do Governo legítimo e não admitem a invasão estrangeira são os maus. Os que dão a vida pela defesa da sua pátria contra os ataques da OTAN não contam e podem morrer nos bombardeamentos.
A tragédia da Líbia já mostrou que para a OTAN, tudo o que mexe é para matar. Os “rebeldes” também levam com bombas em cima e já morreram às centenas com “fogo amigo”. O que está verdadeiramente em causa é o roubo do petróleo. Estou a medir bem as palavras: a guerra da Líbia tem como único fim o roubo do petróleo.
E se esta operação de latrocínio for bem sucedida, amanhã outro país produtor de petróleo ou de matéria-primas estratégicas vai ser ­vítima de uma guerra. O Ocidente não quer pagar o preço justo pelos recursos naturais dos países africanos. Habituaram-se, durante séculos, a ficar com tudo sem pagar. Nos anos de colonialismo as grandes potenciais ocidentais ficaram com tudo: com a nossa terra, os nossos recursos e com a nossa liberdade.
Angola foi o primeiro país africano que decidiu lutar pela independência nacional de armas na mão. Os angolanos não se limitaram a umas revoltas isoladas para inglês ver. Fizeram uma luta armada de libertação nacional que lançou em África as sementes da liberdade e só terminou quando a Namíbia foi independente e o “apartheid” liquidado.
As potências ocidentais não aprenderam as lições que levaram em Angola. É pena porque estão a arrastar o mundo para uma situação que não sendo de guerra total e aberta, vai ser seguramente de ausência de paz, nas suas cidades e nos seus países. Era bom que parassem enquanto é tempo. Mas os exemplos da Líbia e da Costa do Marfim mostram que nada detém as grandes potências na sua estratégia de roubo generalizado das matérias-primas em África.

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